Anteontem
Lição de casa de filosofia: mãe,
preciso saber o que você pensa: como você prova que existe? Descartes aflora
rápido mas os lábios se controlam. Descartes não sabia de tudo, e filho quer
saber o que eu penso. Portanto, ele sabe que penso, não adianta apelar para
máximas abstratas. E não é só essa pergunta, mas uma série delas: como você
prova que o que você vive agora não é só uma lembrança? Como você prova que
isso que você vive é real?
Olho para dentro de mim mesma, e
não consigo provar-me que existo. Procuro-me por todos os lados, perdida que
fiquei dentro de um outro, e aí respondo-lhe: é o outro que prova a minha
existência, que sou eu sem o olhar do outro? Quase lhe falo de alteridade, mas
não vem ao caso mais um conceito jogado no espaço.
Ontem
Os sons do mundo ficaram mais
fracos – apesar dos dois ouvidos congestionados pelo excesso de água dos
últimos dias, piscina, chuveiro, piscina, tentando driblar o calor que assola
por poros e veias, descubro que são todos os sons do mundo que ficaram mais
fracos, e não apenas aqueles que dependem dos ouvidos para se fazerem ouvir. Os
sons do mundo ficam mais fracos e eu mais fraca diante deles.
Hoje
Conceitos desfeitos como pó. Um estado
de desconceituação. A mente não gosta, sai em passeio de buscar respostas. Porque
eu não as tenho, e aviso-a: deixei-as dentro do outro. Desfiz-me de mim mesma,
e meus olhos não dizem tristeza, só dizem que não estou. Não estou nada.
Porque durmo e acordo com a certeza de
estar, mas um vento áspero vem e me derruba a alma, um hálito acre atravessa-me
a pele e me desconcerta, me desalinha. E me diz que é perfeito. Mesmo sem ser. Porque
a perfeição só existe a caminho. E as palavras tornam-se estátuas de pedra entre
os meus dentes, salitre queimando o céu escuro da minha boca, vazio das
estrelas-palavras que o povoam. As palavras secaram-se. Calaram-se. E eu com
elas. Eu com elas num limbo, o silêncio pesado, angústia por trás das hélices de um ventilador ligado.O lugar de onde nascem fechou-se, inerte, à
espera não sei de que: morte, torpor, agonia? Há um voo de pássaros sem sentido
defronte da minha janela, um sem razão repentino, tempo e espaço escoados de
repente para fora da minha pele. Desrevisto-me com uma sensação de peso que não
conforta. Estou sozinha dentro de mim.
Caramba...vou levar pro sono, se consegui dormir
ResponderExcluirbjs
à espera da chuva, do vento que brisa o ser Ana
ResponderExcluirsaudade de ver vc passar em frente da minha porta
voando as tranças da alma amada
Bell