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14/10/2015

Desolado

Assim encontro meu coração, e assim o observo. 

Desolado.

Observo também as palavras que se formam dentro dele, nesse esforço de me afastar do animal em mim e de rodear-me dos atributos que me garantem humanidade. Pensar e encontrar as palavras é o que mais faço. 

Abro os olhos dentro das águas mediterrâneas. Atravessam-nas barcos sem data. É nesse ponto líquido que naufraga o meu coração desolado.

Desolado, porque é a solidão que se agarra a mim sem que eu a queira, esse estado de ser solus, sozinho,  porque abandonado e negado. Meu coração colore de opacidade as fibras dos meus olhos. Tento ver o mundo com os olhos do outro em vez de tentar ver o meu mundo refletido em seus olhos. E por isso meus olhos se afogam, e meu coração naufraga. Onde cabe uma vida opaca assim.

A próxima palavra é devastado. Porque a terra vasta não é só grande - é também aberta e incontida, desabitada e deserta. Acrescento-lhe esse de que lhe agrega a sentença final: "sou completo". Completo vasto. Completo arruinado. Completo desabitado. Completo deserto. Volto à tona falho de oxigênio. Trago a água do mediterrâneo misturada à espuma das lágrimas que deixo no leito. As ondas lavam a praia. As ondas lavam os olhos. Deve haver um novo dia por detrás das nuvens escuras.


Fotografia: Giovani Ferreira
A frase em itálico é, com reformulações, de Carl Rogers, e define o que é empatia.